quinta-feira, abril 04, 2013

Informação em foco: Energia, Brasil, sustentabilidade...


Disponível em: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/energia/conteudo_421755.shtml


Energia - o Brasil na contramão?

"Quem semeia ventos colhe tempestades"

José Goldemberg
O Ministério de Minas e Energia publicou recentemente o Plano Decenal de Expansão de Energia para os próximos dez anos, em que se prevê um aumento substancial da geração de energia elétrica com usinas termoelétricas, usando carvão, óleo diesel e óleo combustível, principalmente nos Estados do Norte do País.

Em termos práticos o que isso significa é que a tradicional energia hidrelétrica (limpa e renovável), na qual se baseou a industrialização do País e que hoje representa 84% da capacidade instalada, vai cair para 76%. O que se vê pois é um aumento de energia que não é nem renovável nem limpa, na direção oposta do que se tenta fazer em todos os países do mundo. 

A Empresa de Planejamento Energético (EPE), responsável pelos leilões de energia, tem uma explicação simples para o que está ocorrendo: a culpa é dos ambientalistas, que criam obstáculos ao licenciamento e à construção de novas usinas hidrelétricas, principalmente na Amazônia. 

A EPE argumenta que as termoelétricas constantes do Plano Decenal "são resultado dos leilões realizados" - o que é verdade. O que a EPE não diz é que os leilões são organizados de acordo com o modelo energético adotado no começo do governo atual e que ele é realmente responsável pelo que está ocorrendo. 

De acordo com esse modelo, vencem os leilões os empreendedores que oferecerem energia pelo menor custo quando a usina começar a funcionar. Aparentemente, esse é um bom sistema, porque favorece os consumidores, mas tem o resultado perverso que favorece também as usinas que podem ser construídas rapidamente, mesmo que sejam poluentes. Os leilões de energia elétrica são, no fundo, como leilões para a compra de papel para uma repartição pública: vence o de menor preço, independentemente da qualidade, o que é uma receita perfeita para comprar o pior. 

A EPE se defende argumentando que cabe ao Ministério do Meio Ambiente e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) cuidar dos problemas da poluição, o que coloca esse órgão da administração pública numa situação difícil, sobretudo quando se trata de construir grandes hidrelétricas que, além de produzir energia, têm impactos além dos ambientais. 

As termoelétricas previstas - quase todas no Norte do País - usam óleo combustível e diesel, que a Petrobrás tem em quantidade. Os órgãos licenciadores daqueles Estados são bastante tolerantes e por isso as obras são licenciadas rapidamente. Dificilmente seriam licenciadas em São Paulo. Já as hidrelétricas são licenciadas pelo Ibama, que argumenta que os estudos ambientais apresentados pelos empreendedores têm frequentemente qualidade técnica que deixa a desejar. 

Jogar a culpa nos outros é sempre a primeira opção, mas o que se vê no caso de energia é que há um desacerto completo dentro do governo. 

Por isso surgiram propostas aberrantes para resolver os problemas (além de substituir a ministra de Meio Ambiente). A primeira é a de que grandes obras hidrelétricas na Amazônia seriam declaradas de interesse nacional e o Congresso Nacional autorizaria sua realização sem ouvir os órgãos ambientais. Ela claramente viola a Constituição e parece ter sido abandonada. 

Surge agora uma outra, determinando que o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) crie um "procedimento extraordinário" de licenciamento para as obras do PAC, consideradas estratégicas. Ela talvez não seja inconstitucional, mas dependerá de aprovação do próprio Conama e o governo, por meio de decreto, não tem poder de obrigar o Conama a fazê-lo. Além disso, ela introduz regras sobre prazos questionáveis para concessão de licenças. 

Essas ideias mostram a confusão que foi criada pelo governo. 

Parte da razão pela qual o Ibama não tem licenciado obras a tempo é que ele foi "aparelhado" no início do atual governo com ativistas da área ambientalista, dos quais os órgãos do Ministério de Minas e Energia se queixam agora. 

A simples profissionalização e o aumento da competência técnica e administrativa do Ibama resolveriam boa parte dos problemas. 

O outro aspecto deste problema é que o modelo energético não abre espaço para energias renováveis e eficiência energética, que é precisamente o que a Europa e os Estados Unidos estão fazendo agora. 

No que se refere à eficiência energética, os órgãos do governo têm o hábito de menosprezá-la, apesar de existir uma lei aprovada pelo Congresso em 2001 que autoriza o Ministério de Minas e Energia a estabelecer limites máximos de consumo dos equipamentos usados no País. (Essa lei só começou a ser regulamentada, timidamente, em 2008.) 

Argumentar que as energias renováveis são caras teria inviabilizado, em 1975, o Programa do Álcool e a energia nuclear, que é tão cara como as renováveis, mas vem sendo subsidiada até hoje. Argumentar, também, que o consumo médio do brasileiro é baixo, e que é essencial aumentar esse consumo para se igualar aos países da Europa, ignora o fato de que nesses países o inverno é rigoroso. Além disso, nossas metrópoles são modernas e nelas se consome energia como em muitos países industrializados. 

Onde o consumo é baixo, como nas zonas rurais, é preciso de fato aumentar o consumo e a qualidade dos serviços. O Programa Luz para Todos está fazendo isso. 

Quanto à judicialização dos processos de licenciamento de hidrelétricas, a ação do Ministério Público às vezes é realmente um problema, mas o que se pode dizer é que é assim em todos os países democráticos e que devemos abandonar o saudosismo dos tempos do autoritarismo. 

*José Goldemberg foi presidente da Companhia Energética de São Paulo.

Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo, página A2

Possível Tema ENEM para 2013


Matéria da Revista Guia do Estudante, disponível em: http://guiadoestudante.abril.com.br
*Análise feita por Liliane Negrão, professora de redação da Oficina do Estudante
POSSÍVEL TEMA: Produção energética brasileira: é possível conciliar expansão, desenvolvimento social e sustentabilidade?
Produção energética brasileira: desafios
O Brasil, como país emergente, possui significativa demanda energética em crescimento. Por esse motivo, deve-se definir a fonte de energia, com os menores impactos ambientais e sociais sem impedir a expansão. Essa conjuntura gera conflitos entre ambientalistas, governo, população e empresas.
O debate entre os diversos tecidos sociais abrange o uso de hidrelétricas. Essa é uma fonte renovável e limpa, bastante disponível no Brasil – por isso defendida por governo e empresas-, porém que recebe críticas de ambientalistas e comunidades tradicionais: para a instalação de hidrelétricas são necessários a destruição de fauna e flora locais e o deslocamento da população residente na área de instalação. Assim, os novos projetos de usinas no norte do país, como Belo Monte, apesar do aumento da demanda energética no Brasil, causam discórdia.
Embora essa fonte possua aspectos negativos, ela é viável para a nação. E a nuclear também pode ser mais bem explorada. Os demais países não detêm potencial hidráulico nem equilíbrio entre fontes renováveis e não renováveis equivalentes aos do Brasil, fazendo-os dependentes de petróleo, carvão mineral e gás natural. Contudo, a falta de acordo entre opositores e defensores de hidrelétricas tem feito sua participação recuar, sendo substituída por termelétricas, poluentes – a queima de matéria orgânica libera gases estufa. Outras fontes renováveis, como a eólica e a solar, ainda são caras e seu uso exclusivo não atende à demanda brasileira.
Quanto à nuclear, gera energia limpa a partir do urânio, recurso abundante no Brasil. Ainda assim, enfrenta resistência em decorrência do temor de vazamento radioativo, capaz de ocasionar mutações genéticas, doenças e mortes. As usinas nucleares dispõem para seu funcionamento, de fluidos circulantes responsáveis por resfriar o sistema. Caso não haja monitoramento dessa ação e de possíveis vazamentos radioativos, os problemas são possíveis. Por outro lado, ao fazê-lo, essa é uma fonte segura, como atestaram cientistas norte-americanos este ano quando apoiaram a construção de novas usinas nucleares nos Estados Unidos.
Portanto, é possível conciliar crescimento econômico e questões socioambientais. Para tanto, é preciso investir em hidrelétricas e energia nuclear, as mais viáveis, e garantir assistência àqueles que serão deslocados, com moradias dignas em áreas compatíveis com seu modo de vida.
A análise
O texto “Produção energética brasileira: desafios” é muito bom, porque responde, com qualidade, à pergunta temática “Produção energética brasileira: é possível conciliar expansão, desenvolvimento social e sustentabilidade?”.
Na dissertação, o autor defende que a energia produzida por hidrelétricas e aquela oriunda de usinas nucleares seriam boas opções de fabricação energética brasileira, por serem vantajosas nos aspectos econômicos e também nos relacionados à proteção do meio-ambiente. Encontrar isso no texto é marca suficiente para o merecimento de um elogio.
Outro ponto positivo do texto relaciona-se ao fato de a dissertação apresentar argumentação bem embasada para sustentar a sua “resposta temática”. No terceiro e quarto parágrafo, especificamente, o autor justifica as escolhas feitas quanto aos tipos de produções energéticas que deveriam ser incentivadas no Brasil, e ainda se preocupa em explicar por que outras espécies de produções de energia não seriam indicadas para a realidade brasileira (“termelétricas, poluentes – a queima de matéria orgânica libera gases estufa. Outras fontes renováveis, como a eólica e a solar, ainda são caras e seu uso exclusivo não atende à demanda brasileira”).
O terceiro ponto positivo deste texto é quanto a sua linguagem: clara, correta, bem pontuada, organizada; o que colabora para uma leitura fluida.
ponto negativo fica para o fato de a intervenção para a problemática em questão, exigida na proposta da redação, aparecer apenas na conclusão, parte esta que deveria servir para retomar os argumentos já anteriormente trabalhados.
A proposta do autor do texto para intervir no problema apresentado – a questão da assistência às pessoas deslocadas por causa da construção de hidrelétricas ou usinas de energia nuclear – deveria ter sido desenvolvida, com atenção e cuidado, ao longo do texto, o que faria da dissertação “Produção energética brasileira: desafios” uma produção redacional ainda mais exemplar.
*Análise feita por Liliane Negrão, professora de redação da Oficina do Estudante